O Evangelho que tem o nome de Lucas, e que reflete sem dúvida a tradição catequética de Antioquia, parece ter sido escrito por um homem de cultura grega refinada, bom conhecedor da Escritura, na sua versão grega dos Setenta.
Para quem foi escrito e com que finalidade?
Lucas afirma querer escrever uma “exposição seguida” da história de Jesus.
Os escritos destinam-se às comunidades cristãs surgidas de entre os gentios,provavelmente evangelizadas por Paulo (Ásia Menor, Macedónia, Grécia…), com origens culturais e étnicas diferenciadas. Por isso, os textos são escritos procurando ser inteligíveis por qualquer pessoa que entenda grego. Poderíamos definir a linguagem de Lucas como simples e clara.
Fontes do Evangelho
Lucas tem uma preocupação cronológica e utiliza diferentes fontes para produzir os seus escritos.
Uma delas é o Evangelho de Marcos, que segue de perto mas ao qual faz algumas “correções”:
– torna a linguagem mais clara
– elimina as palavras aramaicas
– omite o que entende ser desinteressante para os pagãos (Mc 9,11-13)
– procura que o relato seja mais lógico
– Em Lucas, Jesus não caminha sobre a água, não é flagelado antes de ser crucificado e não é coroado com espinhos.
– Difere sobretudo na secção central onde é apresentada a subida para Jerusalém, com várias indicações explícitas repetidas pelo caminho (9,51; 13,22; 17,11), não fazendo referência à existência de diferentes viagens.
– A morte de Jesus não é entendida como resgate da Humanidade.
Mas segue também outras fontes: o texto arameu de Mateus, tradições próximas a João e até informações pessoais.
– A infância de João Batista e de Jesus.
– Hinos e cânticos: Benedictus, Magnificat, Gloria in excelsis, Nunc dimittis.
– Genealogia
– Parábolas: bom samaritano (10,30-37), o amigo inoportuno (11,5-8), a figueira estéril (13,6-9), a moeda perdida (15,8-10), o pai misericordioso (15,11-32), Lázaro e o rico (16,19-31), a viúva e o juiz (18,2-5), o fariseu e o publicano (18,10-14), entre outras…
– Milagres: a pesca milagrosa (5,1-11), o filho da viúva de Naim (7,11-15), a mulher encurvada (13,11-13), o hidrópico (14,1-4), os dez leprosos (17,11-19), a orelha do servo do sumo sacerdote (22,50-51).
– Outros relatos, como a pecadora que lava os pés a Jesus, Marta e Maria, a frase “fazei isto para a minha memória” na Última Ceia, a entrevista com Herodes, a frase de Jesus na cruz “Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que fazem”, os discípulos de Emaús, a ascensão de Jesus…
O que distingue o Evangelho de Lucas?
O Evangelho de Lucas anuncia o Deus fiel ao seu povo de Israel, que lhes envia o Seu filho Jesus. Abre os horizontes da salvação aos impuros e pecadores, aos pobres e doentes, às crianças e às mulheres, aos samaritanos e gentios.
Lucas é também conhecido como o evangelista do desígnio de Deus: “o mistério da Páscoa é o seu foco, o Espírito Santo é o seu autor e a comunidade universal dos crentes é a sua finalidade.”
No Evangelho de Lucas encontramos:
– Um evangelho de oração (Neste evangelho encontra-se o verbo “orar”/“rezar” pelo menos 19 vezes)
– Um evangelho de louvor e ação de graças
Exemplos: Aparecem nesta atitude Maria (1,46), Zacarias (1,64.68), os anjos de Belém (2,13), os pastores (2,20), Simeão (2,28), o todo o povo (5,26; 7,16),
– Um evangelho de alegria e paz
Exemplos: A alegria inunda os pais de João Batista (1,14.41-44.58) / O anjo saúda Maria com um grito de regozijo: “Alegra-te!” / “Salve” (1,28) / Maria entoa um cântico de alegria (1,46-55) / Belém é um hino de alegria celestial (2,10-13)
– Um evangelho de bondade e misericórdia
Exemplos: A misericórdia de Jesus para com os pecadores (7,34; 15,1s.7.10) / para com a pecadora pública (7,36-50)
– Um evangelho que traz uma boa notícia às mulheres
Exemplos: à viúva de Naim (7,11) / à pecadora (7,36) / às mulheres que os seguiam (8,1; 23,49.55)
– Um evangelho para os pobres
Exemplos: Jesus é pobre (9,58) e fala para os pobres (6,21).
Em Lucas, Jesus é o Salvador misericordioso. Atento a todos os desprezados: crianças, mulher, estrangeiros, samaritanos… A todos oferece perdão: à pecadora em casa do fariseu, a Zaqueu, o publicano, ao bom ladrão… Lucas que é o único a mencionar estes episódios e também é o único a contar a parábola do filho pródigo (Lc 15, 11-32)
Seguir Jesus Jesus exige o despreendimento total: “Ai de vós, os ricos!” (Lc 6, 24). Mas é também o evangelho da alegria. Esta brilha em todas as páginas: todos os que seguem cantam as maravilhas de Deus, a começar por Maria no seu Magnificat.
A Lucas associa-se o touro, porque o seu Evangelho concentra-se no caráter sacrificial da morte de Cristo, e o touro sempre foi um animal sacrificial por excelência, tanto para o judaísmo quanto para o paganismo romano.
O Evangelho de Lucas é quem nos acompanha ao longo do ano litúrgico C
Texto retirado do livro “Casa sobre a Rocha“, com adaptações de Claudine Pinheiro