É um texto breve mas que merece a leitura de todos nós e a nossa reflexão.
1. No seguimento da última Visita ad limina Apostolorum, os bispos de Portugal decidiram promover um amplo movimento de auscultação junto do Povo de Deus em ordem à revitalização do tecido pastoral da Igreja em Portugal. A recente eleição do Papa Francisco e as linhas pastorais que já nos traçou são para nós um alento de esperança a «viver a doce e reconfortante alegria de evangelizar».
2. Foram muitos e todos igualmente importantes os contributos que recebemos, pelo que não podemos deixar de expressar a todas as pessoas envolvidas neste processo o nosso grande apreço e a nossa mais profunda gratidão. Reunidos e compulsados todos os contributos recebidos, fazemos agora o elenco dos apelos mais insistentemente repetidos, alguns dos quais já assimilados na vida das nossas comunidades eclesiais. Pedia-se:
a) uma Igreja permanentemente em estado de oração, formação, renovação e missão, cada vez mais atenta a todas as pessoas e aos sinais dos tempos;
b) uma Igreja mais dinâmica e participativa, discipular e missionária, próxima e acolhedora, ao estilo de Jesus, Bom Pastor, e das primeiras comunidades cristãs admiravelmente retratadas nos Atos dos Apóstolos (Act 2,42 47; 4,32 35; 5,12 15);
c) uma Igreja intensamente marcada pela prática da caridade fraterna, que não fique à espera das pessoas, mas que vá ao seu encontro;
d) uma Igreja que se faça companheira de viagem dos jovens, sempre atenta aos seus sonhos, anseios e problemas, tendo em conta que os jovens procuram a Igreja, não para se divertirem, mas para se alimentarem interiormente;
e) uma Igreja que sinta, viva, partilhe e se empenhe a ajudar a resolver os inúmeros problemas que hoje assolam as famílias;
f) uma Igreja que busque sempre o empenho e a participação de todos, sacerdotes, diáconos, consagrados e leigos, para juntos auscultarmos e seguirmos os rumos que Deus nos quiser indicar.
3. Estes elementos recolhidos e agora postos em realce viram-se verificados e confirmados pelo Inquérito levado a efeito pela Universidade Católica Portuguesa, sobre «Identidades Religiosas em Portugal – Representações, Valores e Práticas», que chamou a nossa atenção para uma certa desafeição e quebra de laços de pertença à Igreja de uma parte da população portuguesa, com particular incidência nos jovens.
4. A recente realização do Sínodo dos Bispos, em Roma, pediu insistentemente muito maior empenho, dedicação e carinho na transmissão da fé, mãos nas mãos, de modo a que nos tornemos cristãos convictos e credíveis, bem assentes sobre o único fundamento que é Jesus Cristo (1 Cor 3,11). Pediu também um olhar novo, atento, comovido e evangelizador para este mundo que Deus criou e ama, e que é sua plantação dileta (Is 61,3).
5. Também não podemos descurar que os caminhos que agora se abrem à Igreja em Portugal vêm à luz no contexto do Ano da Fé, do cinquentenário do Concílio Vaticano II e da caminhada para o centenário das Aparições de Nossa Senhora em Fátima.
6. Considerado atentamente todo o processo e o seu enquadramento eclesial, a Igreja em Portugal propõe-se trilhar em comunhão, num só coração e numa só alma, os seguintes rumos:
A) Primado da graça e nova mentalidade
Formar comunidades assentes no primado da graça, da contemplação, da comunhão e da oração, sabendo todos bem, pastores e fiéis leigos, que o essencial da vivência cristã e dos frutos pastorais na vida da comunidade não depende tanto do nosso esforço de programação e da multiplicação dos nossos passos e afazeres, mas depende sobretudo da transformação da nossa mente e da conversão do nosso coração operadas pela ação da graça de Jesus Cristo, que disse: «Sem mim, nada podeis fazer» (Jo 15,5). Neste sentido, queremos intensificar a oração pessoal e comunitária, dar a todas as ações litúrgicas a dignidade que lhes é devida, valorizar a celebração dos sacramentos da Eucaristia e da Reconciliação, criar grupos de escuta e partilha da Palavra de Deus.
B) Comunhão para a missão
Formar comunidades que sejam autênticas escolas de vivência da fé e da comunhão, gerando entre todos os seus membros laços de fidelidade, de proximidade e de confiança, que se traduzam no serviço humilde da caridade fraterna. É este o caminho para avivar o sentido de pertença à comunidade e para fortalecer os laços da comunhão, que é a primeira forma de missão, de acordo com a Palavra de Jesus, Bom Pastor: «Nisto todos saberão que sois meus discípulos: se vos amardes uns aos outros» (Jo 13,35). De acordo também com a forma de viver das primeiras comunidades cristãs.
C) Missão de todos para todos
Os dois rumos anteriores abrem necessariamente para um terceiro: a missão como empenho da comunidade toda e de todos os seus membros. Torna-se, de facto, necessário que todos os itinerários de catequese e de formação cristã assumam esta perspectiva missionária como elemento central quer a nível de conteúdos quer de método. Isto significa que o chamamento à santidade, ao seguimento de Jesus Cristo, ao serviço na Igreja e à missão são uma única realidade a promover desde a iniciação cristã, continuando com os jovens, e envolvendo as famílias, os adultos, a comunidade inteira.
D) Testemunhar a fé revitalizada
Este processo de revitalização do tecido pastoral da Igreja em Portugal continua a requerer o envolvimento de todos os bispos, sacerdotes, consagrados e fiéis leigos, rezando e trabalhando lado a lado, para juntos sentirmos a alegria de sermos discípulos de Jesus Cristo, todos enviados e empenhados em fazer novos discípulos através da transmissão da nossa fé pelo testemunho de vida e pela palavra. A palavra que dizemos tem de ser viva, saboreada e saborosa (Cl 4,6), cheia de Cristo e de esperança activa. O testemunho que damos tem de ser sem disfarces e sem estratégias, humilde, atento, comovido, próximo e acolhedor, profético e evangelizador, que deixe ver, à imagem de Jesus, Bom Pastor, uma Igreja que não se fecha sobre si, mas que sai de si, para o átrio deste mundo que Deus ama.
E) Fomentar iniciativas de iniciação cristã e de formação
É notório que, no mundo em que nos é dado viver, os indicadores que sinalizam os caminhos para a fé se encontram cada vez mais rarefeitos, sendo maiores as dificuldades sentidas no seio da família e das organizações eclesiais para a transmissão da fé às novas gerações. Impõe-se, portanto, uma aposta mais intensa e dinâmica na iniciação cristã das crianças e jovens, bem como no catecumenato de adultos. Prioritária é também a formação da vivência cristã de todos, particularmente dos agentes pastorais e dos líderes cristãos, que os leve a preparar-se, cada vez mais e melhor, para a missão e a nela se empenhar.
F) Comprometidos com as iniciativas pastorais em curso
Várias dioceses têm em curso a preparação ou realização de um Sínodo diocesano. Múltiplas iniciativas pastorais estão em andamento no âmbito do Ano da Fé, do recente Sínodo dos Bispos sobre a promoção da nova evangelização, das celebrações do 50.º aniversário da abertura do Concílio Vaticano II e da preparação do centenário das Aparições de Nossa Senhora em Fátima. Os aspetos acima postos em realce não vêm anular os projetos já em andamento; antes, podem valorizá-los e potenciá-los, e, porventura, provocar uma partilha fraterna mais intensa de todas as coisas boas que já se estão a fazer.
G) A ter sempre diante dos olhos e no coração
Escuta bem, com toda a atenção, Igreja em Portugal:
— reúne-te à volta de Jesus, aprende a rezar e, com Jesus e como Jesus, vai com alegria e ousadia sempre renovadas à procura e ao encontro dos teus filhos e filhas;
— reveste-te sem ostentação nem riquezas, mas com humildade e verdade e com a ternura de Jesus Cristo;
— acolhe e vive o Evangelho como uma graça recebida, transmite-o com amor e fidelidade, e não como um produto para publicitar ou para colocar no mercado;
— põe todo o esmero a preparar e oferecer, com carinho, verdadeiros itinerários de iniciação e de formação cristã para crianças, adolescentes jovens e adultos;
— redobra o teu empenho na preparação dos candidatos ao sacerdócio;
— fica sempre atenta e vigilante e sê persistente em tudo o que diz respeito à formação permanente dos teus sacerdotes;
— reconhece os consagrados pela riqueza dos seus carismas como membros ativos e indispensáveis no crescimento e na ação do Povo de Deus;
— cuida também da formação dos fiéis leigos, com especial atenção aos mais comprometidos na vida da Igreja e da sociedade, e estimula-os a serem verdadeiros discípulos de Jesus e seus missionários apaixonados e felizes no coração do mundo;
— vela sempre, com afeto maternal, por todos os teus filhos e filhas, e nunca deixes que se transformem em meros funcionários, perdendo o ardor e o primeiro amor.
Maria, Mãe da Igreja e nossa Mãe, Senhora de Fátima, ícone do primado da graça e da oração, do serviço humilde que gera laços de comunhão e de missão, sê nossa companheira nos caminhos que agora nos propomos percorrer para sabermos melhor levar Cristo aos nossos irmãos e os nossos irmãos a Cristo.
Fátima, 11 de abril de 2013