«Frequento o nono ano. Há dias, um colega de turma, no intervalo, saudou-nos: «A partir de amanhã, deixo de vir à escola. Entro no seminário para ser padre».
Ficámos pasmados. A mim parece-me que me caiu o mundo em cima. Há dois anos, com uma insistência cada vez maior, sinto o desejo de me fazer religiosa, para me dedicar aos pobres, aos doentes, àqueles que ninguém ama.
Como se faz para se saber se é verdadeiramente um chamamento de Deus, ou é apenas uma sugestão ou um sonho? Como é possível ter a certeza de sermos capazes de levar por diante uma opção deste tipo, tão difícil e a contracorrente? Como terá feito esse meu amigo para decidir? Eu, quando penso em deixar a família, os amigos, a discoteca…
Diz-me qualquer coisa. Ajuda-me. Acordo de noite com estas dúvidas.
Entre parêntesis: sou simpática (é o que dizem os outros!) e os rapazes gostariam de namorar comigo».
Uma voz para «provar»
«Como se faz para saber se é realmente o chamamento de Deus?» Lamento desiludir-te, mas não te posso dar indicações que te dispensem do esforço da procura. Deus não põe cartazes ou sinais para fazer ouvir a sua vontade. Não respeitaria a nossa liberdade. Quem teria a coragem de dizer não a um chamamento de Deus inequívoco e inapelável? Ele quer, pelo contrário, que nós, com calma, com paciência, com confiança, escutemos a sua voz que nos chega através de mil sinais, de situações, de acontecimentos, de pessoas.
Sentes o desejo de te dedicar aos pobres… Experimenta! Na tua paróquia, na tua cidade, haverá certamente jovens que se dedicam ao voluntariado.
Vai ter com eles. Descobrirás se a tua dedicação aos pobres te dá mais alegria que a discoteca. E experimentarás se «aqueles a quem ninguém ama» podem ser a tua família.
E pouco a pouco se fará luz. Lembra-te, porém, que nunca terás uma certeza matemática. A fé, como o amor, exige sempre uma zona de escuridão, um mistério. Exige, a um certo ponto, que se fechem os olhos e se dê um salto no escuro.
Que seria a fé e o amor, se não existisse este momento de «abandono»! As grandes opções não podem ser feitas com o coração na balança.
Uma voz para confronto
Contemporaneamente, é muito importante encontrar uma .pessoa com a qual possamos abrir-nos, esclarecer-nos, confrontar-nos.
Os pais? Inicialmente pode ser arriscado. O medo instintivo de «perder» uma filha pode trazer reacções inesperadas e não garante uma visão objectiva do problema.
Um padre? Está muito bem. Um padre que tu estimes, que te conheça bem, ou que esteja disposto a estar contigo e a escutar-te com paciência para te conhecer bem. Infelizmente, hoje nem sempre é fácil encontrar um padre para conversar.
Uma religiosa? Muito bem. Talvez, pelo menos inicialmente, pode ser melhor que um padre.
Ou então uma amiga madura, na qual reconheces uma fé cristã adulta e profunda. Verdadeiramente profunda. Este é o requisito fundamental. Sem a fé, as escolhas «de fé» não podem ser percebidas.
Uma outra indicação para saber interpretar a voz que sussurra dentro é a oração. Quando nos enamoramos por alguém, se não se quer que o amor esvaneça pouco a pouco, é necessário encontrar-se e falar com o namorado. Assim é com Deus. «Mas Deus responde?» Certamente que não é como quem pergunta a hora exacta à telefonista. Mas a sua voz, de uma maneira ou de outra, faz-se ouvir. É como quando nós, que estamos habituados aos ruídos da cidade, nos encontramos, a sós, no campo. Ali não ouvimos nada. Mas, se temos paciência para escutar o silêncio, esse pouco a pouco enche-se de sons e de vozes.
A garantia
«Como é possível ter a certeza de que seremos capazes de levar avante uma escolha deste tipo?».
Não existem «seguros contra todos os riscos» neste campo. Quem escolhe a vida religiosa (mas será tão diferente para quem escolhe amar uma outra pessoa para sempre, nas alegrias e nas adversidades?) não põe a confiança na sua fidelidade, mas confia totalmente em Deus.
Entre parêntesis
O facto de seres «simpática e os rapazes gostarem de namorar contigo» é um ponto a favor da consistência e autenticidade da «voz» que ouves.
A opção pela vida religiosa nunca pode ser feita por um sentimento de desilusão, de frustração, de fuga de si próprios e do mundo.
A vocação religiosa é autêntica, se optarmos por ela, «porque encontrámos um tesouro», que vale mais que tudo.